Vou contar um pouco sobre a minha experiência pessoal desde que cheguei ao Japão. Há 4 anos, quando minha filha mais velha estava com 6 anos, viemos para o país a trabalho. Assim, fiz a matrícula dela na pré-escola, depois de eu e meu marido termos passado por entrevistas em 2 escolas, onde nos disseram que não havia vaga no momento. Acho que pode ter sido pelo fato de não conseguirmos nos expressar muito bem em japonês, mas não tenho certeza. Por sorte, a escola que mais gostamos era a mais próxima de nossa casa e foi a que aceitou a nossa filha.
Como era uma escola da prefeitura, não havia uniforme e poderia levar os materiais que já tinha em casa, sem a necessidade de comprar, porém não tínhamos nada e fomos às compras. Era tudo bem diferente e interessante; na época eu não entendia nada sobre as sacolinhas de panos certas para cada coisa, o vendedor é que me mostrava o correto.Tanto que, já cheguei a enviar sapatilha em sacolinha que serve para levar os talheres e hashi. No Brasil, não tem esse costume. Normalmente levam-se os tênis em qualquer sacolinha de mercado.
Sobre a comunicação, minha filha não sentiu dificuldade e a professora também nunca reclamou nada a respeito. Não falar nada da língua japonesa não fez diferença para ela mas fez para mim. O que posso dizer é que é muito diferente. Foi um choque para mim sem saber nada de como seria a escola, já que cresci e estudei no Brasil. Mas a prefeitura sempre esteve muito presente com ligações e enviando cartas para auxiliar. Meses antes do início das aulas, convocaram todos os pais para uma reunião para mostrar os materiais que precisariam ser levados para a escola. Depois, a mãe da líder do grupo de crianças no qual a minha filha iria junto, veio até em casa me avisar sobre o ponto de encontro de todas as manhãs para irem juntas para a escola sem nenhum pai acompanhando. E isso me deu um frio na barriga no primeiro dia de aula, imaginando como minha filha iria reagir sem que eu estivesse por perto e com aquela mochilona, a Randoseru. É uma mochila de um alto valor mas dura por todo o período escolar, nos 6 anos do ensino fundamental. Tudo é muito diferente!
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Randoseru de várias cores
Antes do primeiro dia de aula e de ser informada sobre a minha filha ir sozinha, houve a cerimônia de entrada, onde os pais e as crianças vão à escola. Exatamente como a gente vê nos mangás; era aquela época da sakura florescendo e caindo das árvores, as crianças vestindo roupinhas sociais, parecia até que a gente estava vivendo em um desenho japonês.
E minha filha foi sozinha todas as manhãs. Um dia, me contou que a refeição era servida com chá e ela não gostou, então não tomava. Só que também não sabia explicar o porquê e a professora veio me perguntar o que se costumava tomar em casa junto com o almoço, então eu disse: suco! Ela ficou espantada, hahaha! Porque o suco é como se fosse um doce que  toma fora do horário das refeições, principalmente na infância. A partir daí, ela passou a tomar água e as crianças também perguntavam a ela o porquê de preferir água se tinha chá, que era muito mais gostoso. Essa foi a única parte que a minha filha estranhou.
Chegou o dia da formatura e eu como mãe muito agradecida pelas professoras cuidarem com tanto amor da minha filha, resolvi comprar um presente. Na reunião final com os pais, percebi que todos tinham comprado presente também e uma mãe veio falar comigo pedindo desculpas por não ter conseguido entrar em contato comigo mas incluíram meu nome no presente mesmo assim. No final, fui me despedir da professora e entregar o presente só que foi uma situação meio embaraçosa pois ela não sabia o que dizer. Foi correndo na diretora que estava ali ao lado para saber se podia receber. Então me caiu a ficha: elas não podem receber presentes, para não haver diferenças entre elas! Pedi milhões de desculpas e disse que tinha compreendido a situação. No Brasil isso é uma coisa muito comum.
São coisas simples, mas que se tornam interessantes quando você vem de outra cultura. No começo sempre há o choque cultural, mas no passar do tempo nos acostumamos e entendemos as diferenças. Hoje, a minha filha está indo para o quarto ano.
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Eu a tive em 2008, na primeira vez que vim ao Japão. Já estava aqui há 3 anos e não sabia nada sobre ser mãe e ainda ainda estava longe da minha mãe, ou seja: tive que aprender a me virar e a revirar, hahaha!
Comecei o pré-natal em uma clínica e logo me informaram que deveria pegar a caderneta de gravidez na prefeitura, que era onde todas as consultas e cursos eram anotados. Acredito que seja assim no Brasil também.  Assim que minha filha nasceu, a assistente social da prefeitura veio me visitar em casa, o que achei bem diferente esse tratamento que se recebe cada criança nascida na cidade. Alguns meses depois, teria o direito de fazer gratuitamente o exame obrigatório. A cada consulta na época, eu pagava apenas um pequeno valor que não lembro ao certo, mas no caso eram moedas. O inesperado para mim foi que todo esse valor que paguei para o parto, me foi retornado pela prefeitura, e a cada 4 meses minha filha recebia um valor em dinheiro para ajudar com os gastos em fraldas e leite. Foi há 8 anos.
Quando ela estava com 10 meses, retornei ao Brasil e foi uma mudança e tanto. Tivemos que nos readaptar em todos os aspectos. Mas depois de 5 anos voltamos para o Japão novamente. Minha filha já tinha 6 anos e fiz a matrícula dela na pré-escola, como falei mais acima.
Engravidei a segunda vez aqui no Japão e em outra localidade, mas tudo fluiu como há 8 anos. As diferenças foram no hospital, onde pude escolher ter a bebê em um chão de tatami, acompanhada pela minha outra filha e meu marido em tempo integral, como um parto humanizado no Brasil. E que nessa localidade, as consultas são todas gratuitas. O governo ainda mantém a ajuda de custo com as fraldas e leite da mesma forma que tive com a minha filha mais velha.
Quando nós, dekasseguis, viemos ao Japão para trabalhar e viver, levamos a vida de uma forma, porém quando temos os filhos aqui, podemos vivenciar um outro lado da sociedade no país. Nos sentimos mais inseridos e a partir daí, também surgem novos pensamentos para o futuro.

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Post por Priscila Uehara. Priscila é descendente de japoneses, atualmente mora no Japão e adora fazer doces gostosos.
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